Também vamos contigo

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro

Estamos celebrando o terceiro domingo da Páscoa! Festa da Páscoa que continua a ser celebrada em nossas comunidades com muita alegria, fazendo vivas e atuais aquelas palavras do salmista: Este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e nele exultemos (Sal 118, 24).

Estamos também iniciando o mês de maio, reconhecido pela tradição piedosa da Igreja como o mês de Maria, onde contemplamos aquela que nos indica o caminho para Jesus. A oração do terço, que está já sempre presente em nossas mãos e em nossos corações deve ser incrementada pela contemplação nestes dias, colocando as várias intenções da Igreja e de cada um de nós. Que Maria nos aponte e nos conduza cada vez mais para este encontro com o Senhor, apresentando-o como Senhor de nossas vidas.

Iniciamos também a 57ª Assembleia Geral dos Bispos do Brasil. Começamos no dia 01, dia de São José Operário, onde prestamos nossa oração e nossa homenagem a todos os trabalhadores, rezamos para que melhorem essas situações de desemprego e dificuldades econômicas em nosso país. Nessa primeira semana passamos aprofundando e aprovando as novas diretrizes gerais para a ação evangelizadora da Igreja no Brasil. Na segunda semana, após passar o final de semana em retiro espiritual, vamos realizar as eleições da nova presidência e comissões episcopais da nossa Conferência Episcopal. Pedimos orações para que possamos estar abertos à ação do Espírito, encontrando que seja o melhor para a Igreja no Brasil em nossa tarefa evangelizadora sendo ao mesmo tempo elo de unidade entre realidades tão rica e diversas como a nossa.

Temos como tema central deste Terceiro Domingo da Pascoa um trecho do capítulo 21 do Evangelho de João que pode ser proclamado de duas formas: uma forma mais breve (Jo 21, 1-14), de acordo com as necessidades pastorais e a forma mais longa (Jo 21, 1-19), que traz uma segunda parte com aspectos importantes para nossa reflexão. O Evangelho vai apresentando um dos episódios importantes que a Igreja vai vivendo logo após a Ressurreição do Senhor:

Jesus apareceu de novo aos discípulos, à beira do mar de Tiberíades. (Jo 21,1).

Jesus que aparece junto à pescaria. O gesto de aparecer junto à pescaria, gesto daquele que chamou os discípulos a serem pescadores de homens toma aqui um significado simbólico: a pescaria significa evangelização, proclamação da Boa Nova que dá sentido à vida de todos os homens e mulheres, significa sermos missionários.

Estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu e outros dois discípulos de Jesus. Simão Pedro disse a eles: ‘Eu vou pescar’. (v.2 e 3).

Cada palavra nesse evangelho tem a sua devida importância. Pedro, aquele que toma a palavra, é aquele que Jesus deixou como sinal de unidade para confirmar os irmãos. Tal missão é continuada por meio de seu sucessor, o Papa Francisco. Pedro toma a iniciativa da pescaria, que analisada em uma perspectiva simbólica, Pedro quem toma a iniciativa na Evangelização. ‘Eu vou pescar’: vou evangelizar, vou ser missionário, vou proclamar as maravilhas de Deus ao mundo. É importante que possamos traduzir essa importância com a ação evangelizadora da Igreja simbolizada em Pedro.

Por outro lado, o texto provoca aquilo que seria uma saudade de um desejo que deveria estar presente em todos nós. Mais do que alguém que precisa ser chamado para a missão evangelizadora, nos diz a leitura: Eles disseram: ‘Também vamos contigo’. Saíram e entraram na barca (…) (v. 3). Eles não esperaram ser chamados. Eles se ofereceram por iniciativa própria. Vemos aqui a disposição missionária que é pedida e esperada de todos os cristãos e que deve marcar nossa vida e caminhada de fé. À voz de Pedro os outros se colocam disponíveis para que aconteça a evangelização, a missão, a pescaria. Esse parece ser um dos grandes segredos de quem se encontrou com o Senhor: é algo tão marcante e forte que não há outra possibilidade senão anuncia-lo, não como um peso ou uma obrigação, mas um movimento espontâneo daquele que transborda pela grandeza do dom recebido.

Se Pedro vai evangelizar, vamos também nós com ele! Mesmo que estejamos em condições inóspitas e de dificuldade, como nos mostra a passagem, onde não conseguiram pescar nada naquela noite: Saíram e entraram na barca, mas não pescaram nada naquela noite. Já tinha amanhecido, e Jesus estava de pé na margem. Mas os discípulos não sabiam que era Jesus.

Então Jesus disse: ‘Moços, tendes alguma coisa para comer (v. 3)?’

Não havia nenhum resultado da missão. Não trabalhamos na vinha do Senhor para ver resultados. Nossa maior alegria em recompensa é ser considerados dignos de semear essas sementes, de poder ser pescadores desta pescaria.

Responderam: ‘Não’. Jesus disse-lhes: ‘Lançai a rede à direita da barca, e achareis. ‘Lançaram, pois, a rede e não conseguiam puxá-la para fora, por causa da quantidade de peixes (v. 4-6).

A iniciativa pode ser de Pedro. A iniciativa de acompanhar Pedro pode ter sido dos outros. Mas a eficácia da pesca só quem realiza é a obediência ao Senhor. A eficácia da evangelização é muito mais um gesto de obediência ao mandato do Senhor e fé em sua ação e presença do que a mera vontade pessoal. Fazer a nossa parte é muito importante, mas o fundamental é confiar, acima de tudo, na palavra do Senhor: Lançai as redes. Aquilo que os discípulos, que eram profissionais da pesca não conseguiram, foi possível pela ação do mestre. E o resultado é surpreendente, superando mais uma vez as expectativas humanas dos que ali estavam.

Então, o discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: ‘É o Senhor!’

Simão Pedro, ouvindo dizer que era o Senhor, vestiu sua roupa, pois estava nu, e atirou-se ao mar. Os outros discípulos vieram com a barca, arrastando a rede com os peixes. Na verdade, não estavam longe da terra, mas somente a cerca de cem metros. Logo que pisaram a terra, viram brasas acesas, com peixe em cima, e pão. Jesus disse-lhes: ‘Trazei alguns dos peixes que apanhastes’. Então Simão Pedro subiu ao barco e arrastou a rede para a terra.

Estava cheia de cento e cinquenta e três grandes peixes; e apesar de tantos peixes, a rede não se rompeu. Jesus disse-lhes: ‘Vinde comer’ (7-12).

Na tradição da Igreja, alguns comentaristas viram no número 153 o número de nações conhecidas na época, ou seja, todos são chamados a serem evangelizados; todos são chamados. Quanto mais gente vem ao seio da Igreja, a rede não se rompe. No futuro acontecerão dificuldades, divisões, mas nenhuma delas venceu a presença e a eficácia da ação da Igreja.  Esta palavra é um convite a estarmos unidos a Pedro e a evangelizar em todas as situações.

O Evangelho prossegue falando do diálogo de Jesus com Pedro:

Esta foi a terceira vez que Jesus, ressuscitado dos mortos, apareceu aos discípulos. Depois de comerem, Jesus perguntou a Simão Pedro: ‘Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?’

Pedro respondeu: ‘Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo’. Jesus disse: ‘Apascenta os meus cordeiros’. E disse de novo a Pedro: ‘Simão, filho de João, tu me amas?’ Pedro disse: ‘Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo’. Jesus lhe disse: ‘Apascenta as minhas ovelhas’. Pela terceira vez, perguntou a Pedro: ‘Simão, filho de João, tu me amas?’ Pedro ficou triste, porque Jesus perguntou três vezes se ele o amava. Respondeu: ‘Senhor, tu sabes tudo;

tu sabes que eu te amo’. Jesus disse-lhe: ‘Apascenta as minhas ovelhas (14-17).

Três vezes Jesus pergunta a Pedro. A tradução para o português não nos ajuda a distinguir bem a diferença nos verbos utilizados por Jesus ao perguntar e por Pedro ao responder. Mas o sentido geral deixa claro na resposta de Pedro: Senhor, tu sabes que te quero bem, que te amo. Somos chamados a cada vez mais poder proclamar isso, nós que amamos Cristo e que queremos cada vez mais segui-lo. Junto com o convite a estar com Pedro e Evangelizar, a liturgia de hoje nos convida a confirmar nosso amor pelo Senhor. Mesmo que o tenhamos negado por 3 vezes, sempre é tempo de voltar atrás e deixar que o Senhor nos restaure. O Evangelho finda mostrando a missão que Pedro recebe mais uma vez, de cuidar do rebanho de Cristo e a maneira com que iria morrer: Jesus disse-lhe: ‘Apascenta as minhas ovelhas. Em verdade, em verdade te digo: quando eras jovem, tu te cingias e ias para onde querias. Quando fores velho, estenderás as mãos e outro te cingirá e te levará para onde não queres ir.’ Jesus disse isso, significando com que morte Pedro iria glorificar a Deus. E acrescentou: ‘Segue-me’ (18-19). Não sabemos o dia de amanhã, nem como e quando morreremos. Podemos até dizer que para nós cristãos, isso não importa. O que nos importa é o hoje do Amor de Deus e a amorosa tarefa de segui-lo, como termina o Evangelho de hoje.

De tal forma amamos Jesus que não há outra forma de se viver senão anunciando. É exatamente isso que nos recorda a primeira leitura da celebração deste terceiro domingo da Páscoa (At 5, 27b-32.40b-41) que nos fala da proibição feita aos apóstolos de pregar o nome de Jesus: Naqueles dias: os guardas levaram os apóstolos e os apresentaram ao Sinédrio. O sumo sacerdote começou a interrogá-los, dizendo: ‘Nós tínhamos proibido expressamente que vós ensinásseis em nome de Jesus. Apesar disso, enchestes a cidade de Jerusalém com a vossa doutrina.

E ainda nos quereis tornar responsáveis pela morte desse homem!'(At 5, 27b-28). O querer calar a Igreja para não falar sobre Jesus foi algo que sempre aconteceu desde o início, como acabamos de ler. Ainda hoje acontece. Mas nada nem ninguém pode nos separar do amor de Cristo (Rom 8,35) e Anunciar o Evangelho não é Glória para mim. É um dever. Ai de mim se não evangelizar (1Cor 9, 16)! Assim notamos na resposta de Pedro ante as acusações recebidas no Sinédrio: É preciso obedecer a Deus, antes que aos homens. O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós matastes, pregando-o numa cruz. Deus, por seu poder, o exaltou, tornando-o Guia Supremo e Salvador, para dar ao povo de Israel a conversão e o perdão dos seus pecados. E disso somos testemunhas, nós e o Espírito Santo, que Deus concedeu àqueles que lhe obedecem'(29-32) Longe de desanimar com as proibições e os açoites recebidos, os apóstolos saem felizes porque foram considerados dignos nessa missão de sofrer por causa de Cristo.

Finalmente, a segunda Leitura (Ap 5, 11-14), apresenta a grandiosidade do cordeiro Imolado: ‘O Cordeiro imolado é digno de receber o poder, a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória e o louvor’ (Ap 5,12). Cristo glorioso merece a mesma adoração que o Pai. A grande multidão de anjos proclama a plenitude da perfeição divina de Cristo, o Cordeiro. Aqui são enumerados sete atributos que refletem a plena posse da glória Divina por parte do Cordeiro.

Que o Senhor nos ajude a sermos evangelizadores humildes, a evangelizarmos a todos e ao mesmo tempo dar testemunho de que amamos Cristo Jesus. Preparemos para atender o pedido que o Papa Francisco nos tem feito de uma ação mais intensa de evangelização em outubro deste ano. Tenho certeza de que esta palavra do Senhor deve impulsionar ainda mais nossa missionariedade. Que o Senhor Ressuscitado nos conduza.

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